domingo, 1 de junho de 2008

Mil perdões em poucas linhas.

Se eu disser não você me perdoa? Sim? Por favor! Eu digo não. Não venha amanhã, nem depois, nem ligue nem mande e-mails. Talvez eu te procure nesse meio tempo, mas não me leve a sério. Me ignore, por favor. Finja que não percebeu minhas investidas. É que às vezes sou como uma criança com um brinquedo novo, ou um jogo que acabou de ganhar de presente _ quero testar todas as possibilidades, experimentar o controle remoto pra ver se funciona mesmo. Apertar a tecla vermelha e ver no que é que dá.

Perdão por isso. Está me entendendo? Eu peço perdão. Ajoelho se for preciso. Jamais ousaria magoar um inseto, quanto mais você, que eu considero de primeira linha. Um cara bacana, respeitado, cheio de charme. Discretamente elegante, fino, culto. Você de terno faz tremer qualquer passante, ainda mais se for mulher e tiver miolo mole, como eu. Nossa... Quando você fala de si, da sua vida, sua brilhante carreira eu tenho arrepios... Ouço atentamente seu monólogo, cujo tema é invariavelmente “Eu e eu e minhas circunstâncias”, suspiro aqui e alí, emito algumas interjeições, digo ohs e ahs e te fito com meu olhar mais inocente. Que performance! Shirley Temple ficaria rubra de inveja caso me visse. No entanto você acrescenta alguma frase nova à antiga história, aperta meu joelho, olha em torno para ver se realmente todos em volta também ouviram ( você fala alto, meu bem...) e se dá por satisfeito. Eu tomo outro gole da cerveja que ainda não esquentou, sorrio para você e te olho como se visse Deus em pessoa descer em uma nuvem. Você crê em mim... sempre crê em mim. E nesse momento eu sinto um remorso da peste me roer as cordas vocais e fico sem palavras diante da minha própria atuação. Não sei se me parabenizo ou me estapeio. Foi mal. Fui má. E seu sorriso cúmplice me coroa de espinhos a consciência pesada. Me perdoa? Sim? Por favor?

Me pergunto porque faço isso e nunca me respondo. Na verdade a resposta é ignorada. Sou uma ignorante dos meus hábitos mais inconsequentes e fúteis. Que de fúteis nao têm nada, porque no fundo tenho plena consciência de que alimento uma fraude: seu ego. Pobre ego seu, caso sonhasse a falsidade da minha aquiescência... Pobre ego que eu quebraria em dois ou esmigalharia em estilhaços com uma só palavra verdadeira...“ Imbecil”... palavra essa que, lógico, jamais direi para não te decepcionar com minha crítica mordaz, nem te desestruturar com a verdade mais óbvia. Claro que não faria isso. Nunca seria esse ser sincero a te sussurrar sua prolixidade, ou sua vaidade exacerbada, contar que suas histórias já caducaram de velhas... que o tom da sua voz incomoda e que você não é nem de longe tão carismático quanto pensa. Faço caras e bocas, te olho no olho com a pureza de um récem-nascido, digo um “incrível meu bem...” tão fantástico, que corro sempre o risco de acreditar no meu personagem catabúlico... Sou indigesta, mas você não sabe, sou difícil de enganar, mas quem adivinharia? Nem São Tomé correria o risco de me adicionar no seu msn. Ou Calabar me teria no seu orkut. Sou camuflada, falsa, fogo fátuo, maria-vai-com-as-outras, inconsequente...

Me perdoa? Perdoname? Pardon... Excuse me… Carregue para longe sua pasta de couro legítimo e seus óculos tão em moda. Porque nada está mais fora de moda que suas gravatas bizarras, seus amigos discursivos, sua mania de dizer “ sou o que sou”, como se isso fosse o máximo e não um incentivo a procurar ajuda terapêutica.

Desapareça do mapa antes que eu me vista de salvadora da pátria e caia de amores pelos seus desvelos, seus achaques todos, sua excentricidade que beira a esquizofrênia. Se eu te telefonar, desligue. Se eu te escrever, delete. Caso eu faça pior e buzine diante da sua porta, se faça de surdo, pegue mais uma skol no frezer e aumente o som da TV. Faça isso pro seu próprio bem. Pro meu próprio bem. Pro bem da cidade, da pátria, do universo... Ou não me responsabilizo pela paixão que você vai me dedicar, inutilmente. Ou pela dor que vou te causar, levianamente. Nem pelos estragos que posso fazer à minha alma imortal, diante da sua extrema e incorrigível chatice. Tenho dito.

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