quinta-feira, 11 de setembro de 2008

AMOR E SEPARAÇÃO

Ontem, mexendo no YouTube, vi um vídeo com uma palestra do psicanalista Flavio Gikovate. O tema POR QUE OS AMANTES SE SEPARAM? foi desenvolvido com tanta propriedade, tanta maestria, que desejei ver novamente agora. Resultado: Sumiu, não está mais lá… Sei que devia ter pego o link, ou algo assim, mas não me ocorreu fazer isso. Pensei que ele estaria à mão, sempre que eu quisesse rever. E agora?
Agora estou aqui, pensando nas palavras que ouvia… e que tentarei passar para o papel em forma de texto, porque a abordagem é totalmente nova e instigante. Gostaria muito de poder expressar, ao menos, a idéia geral do que o video me mostrou.
Por que os amantes se separam? Amantes aqui, com a conotação que usualmente dão ao termo_ aquele que ama alguém indisponível , casado com outra pessoa. Ou aquele casado indisponível que ama outro..._ no sentido meio pejorativo…amor proibido, escondido, uma forma de amor diferente, porque ao entrar em um relacionamento condenado a acabar, por força das circunstâncias externas, o amante entrega muito de si, faz uma espécie de investimento a curto prazo, onde o melhor é empregado. Logicamente o amante, em sua vida conjugal, já vinha arrastando um relacionamento de péssima qualidade (ou ele não se tornaria amante e apaixonado por outro) e ao encontrar o amor, sua entrega ( que ele crê, provisória, sem futuro) se reveste com as cores densas da paixão e ele pode enfim viver com toda plenitude uma relação rica, plena de afinidades, carinho, sexo, companhia verdadeira.
Mas para todos esses amantes, mais cedo ou mais tarde, a separação chega, Cada um vai para o seu lado, sentindo uma dor tão forte quanto a morte_ a morte de ter morrido para o amado_ tentando se adaptar melhor ao próprio casamento, mesmo que este se torne cada vez mais difícil e impróprio, depois da vivência do amor verdadeiro.
Na verdade há vários estudos que provam que todos os grandes amores secretos terminam em separação. A causa, diziam todos os estudos sociológicos e psicológicos feitos, eram os fatores externos… a sociedade não aceitaria… o cônjuge era responsabilidade sua… os filhos… os amigos do casal… os bens… No entanto, modernamente, várias teses comprovaram a imprecisão dessa afirmativa. Ainda que os fatores externos não contassem pontos, que a sociedade não mais punisse os separados, que o cônjuge não se mostrasse tão avesso à separação, ainda assim os amantes continuavam deixando seus amores e voltando para casa, para esposas e maridos mal humorada e distante, para sua vida muitas vezes melancólica por causa da renúncia voluntária e aparentemente imprescindível.
Quantos e quantos apaixonados renunciam ao seu amor em nome dos bons costumes e das convenções sociais? Abrem mão da melhor forma de vida conhecida_ aquela em que as coisas e circunstâncias passam a valer a pena, porque estão finalmente recebendo o amor, a paz e o aconchego pelo qual todo ser humano busca sem cessar… deixar de ser uma metade, para ser um inteiro, com possibilidades infinitas de crescimento pessoal, emocional, espiritual…_ para retornar a um lar onde arrastará para sempre sua história de amor inacabada e triste, onde não conseguirá dar felicidade nem a si mesmo, nem ao cônjuge, nem aos filhos.
Por que os amantes se separam?
Por que?
A resposta está nos fatores internos, não nos externos.
A resposta está numa palavra : MEDO
Os amantes se separam por medo. Um medo enorme, inconsciente. Medo da felicidade, por exemplo. Quanto mais amor, mais cumplicidade, mais alegria, maior o medo . Medo de ser punido, de que um raio caia e dizime tudo, de que a felicidade não seja algo desse mundo e que portanto vai pagar o preço exorbitante por ser feliz. Medo.
Medo da perda, de ser expulso do paraíso por aquele que é o maior encantamento. Algo assim como ser parido do ventre amoroso e aconchegante da mãe para um mundo hostil e inóspito. Medo.
Medo de se perder, de perder a própria individualidade, de ser engolido pelo calor e desejo do outro. Ou do seu. Medo.
Faz sentido pra você?
Pra mim fez todo o sentido… comecei a entender certas reações e certas atitudes com uma clareza e um frescor absolutamente novos.
O casamento, diz o psicanalista, se estabelece no equilíbrio entre defeitos e qualidades… o ser humano imaturo escolhe para si alguém com qualidades que o atraiam, mas com defeitos que o afastem, para assim se assegurar de que não se perderá no amor do outro, nem se aniquilará nas teias do relacionamento. É uma escolha inconsciente pelo médio, o aceitável, o formal. Por isso tantos casamentos apenas se arrastam na mesmice… não foram feitos pra crescer, mas pra permanecer.
O amor que se encontra no descampado da paixão, onde a busca pelo completo, mas efêmero, se estabelece, forma então a verdadeira aliança entre corações e almas, porque não há o medo absurdo de se perder no outro, ao contrário, a porta de saída está sempre aberta aos amantes… sempre à vista, presente… é só sair, só se despedir e dizer – Sinto muito! _ e voltar pra casa.
Entendem a diferença? Ela está no medo também.
Assim, o casamento é o equilíbrio onde nada de mal pode acontecer, porque se estabeleceu as normas com uma pessoa previsível .
E o relacionamento com o amante é a entrega onde tudo pode acontecer, porque sendo o que se é e permitindo ao outro ser o que é, não se pode prever os resultados, nem mergulhar no mar sem riscos de se ser engolido para sempre.
Estamos falando de AMOR de primeira qualidade, amor verdadeiro, paixão intensa… É nessas circunstâncias que os amantes se separam mais rapidamente para viver uma vida em separado muito, muito triste e solitária.
Tem solução? Ou os que amam verdadeiramente vão sempre se separar e viver uma relação de quinta junto a alguém que apenas suporta? Ou que no melhor dos casos se torna um amigo, irmão?
Sim.
Sim, tem remédio.
Não é preciso que seja sempre assim. Os amantes não precisam se separar, quando o amor é grande e verdadeiro.
A pergunta é: _ Como se livrar de todos os medos: ser feliz, ser expulso do paraíso, perder a própria individualidade?
A resposta : Tendo consciência profunda desses medos, trabalhando com eles, trabalhando em sí mesmo para estabelecer antes uma conexão tão forte consigo mesmo, uma individualidade real e preparada, uma maturidade verdadeira. Lançar um olhar crítico para toda a situação e desvendar os véus que encombrem todas as atitudes que tomamos. Ter a coragem de dar nomes aos bois, ou seja, chamar de medo ao que é medo. Chamar de amor o que é amor. E chamar de conveniência o que é conveniência…
Acima de tudo saber do fundo da alma, que o ser humano só realiza suas melhores potencialidades quando investe na qualidade dos próprios relacionamentos. Quando troca o médio pelo melhor. Quando pode viver o melhor da vida ao lado de quem realmente é capaz de viver o melhor da vida ao seu lado.
Mas isso não é fácil.
Viver não é fácil.
Amar de corpo e alma não é nada fácil.
A escolha existe. Existem as duas opções.
Quem puder, que viva a melhor delas.

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